Confraternização

(Na geladeira)

quarta-feira, maio 23, 2007

Muito pano pra uma manga só

Se o negar ser algo é o primeiro passo para sê-lo, sempre nos rimos disso. Mas, um dia, como sempre esperamos que aconteça aos outros, entendemos aquilo que ignorávamos até com certo desdém – e talvez ironicamente. Porque só quem se negou por muito, muito tempo a mergulhar em um determinado lago da vida – e não falo desses laguinhos do todo-dia de merda que vivemos –, só esses – os que se negaram por muito – podem enfim se atirar aos gélidos e às profundezas de um determinado lago da vida e sentir seu calor e sua intimidade. Podem bradar – ainda que a medo –: “Mais! Mais!” Podem rogar a qualquer entidade por mais frio – que os há de aquecer ainda mais a cada negativo, ainda que esse os venha a matar de hipotermia ou coisa que valha. Podem provocar o Monstro do Lago a que os venha devorar – e que não se creia que além do medo têm, sim, uma vontade formidável de serem, de fato, devorados. Perceberam, afinal, os riscos daquilo. Mas, ao contrário dos que se banham – felizes, de acordo consigo mesmos – nas pias do todo-dia, optam com força – chamariam a isso obsessão, e os ditos obsessivos ignorariam forçosamente – por mergulhar e, quiçá, morrer naquilo a que tanto tempo de negação – ou teriam sido apenas extra-cautelosas considerações acerca das observações feitas ao longo de tanto tempo? –, optam por morrer naquilo a que tanto tempo de negação os levou, por fim, a carinhosa e certeiramente enlaçar. Se estiverem errados, que importa?! Quem estará certo, quando um físico alemão, curioso por paixão, imaginando a fissura do invisível com os olhos puros de uma criança, não tenha previsto a fenda que tal fissura haveria de abrir, numa faísca de tempo, no esqueleto do próprio Ser Humano? Ao ponto de transformá-Lo em cinzas. E tudo por conta das piazinhas de água quente que, na maioria das vezes, são mais frias que o mármore das lápides. Haveríamos de rir mais de nós mesmos, de nossa miséria em acabarmos cedendo à voz – que nós mesmos odiamos – que nos ordena, com uma notinha de rodapé qualquer, a nos mantermos longe desse e/ou daquele lago, porque esse é gelado e aquele tem um monstro dentro. Era questão de tempo.
Mas se haveremos de morrer de frio e/ou devorados, isso é outra história. Há quem prefira um quinto andar simples. E quem prefira não abrir os pára-quedas. Se aqueles não morrerão e esses encontrarão uma turbina a meio segundo da porta... como prever? E quem terá estado certo?
Algum Monstro benevolente – insaciável porém – perguntaria, antes do ato atroz: “Mas por quê, meu caro, no meu lago?” Mas a resposta – justificável apenas pra quem a tem – vai pro estômago do Monstro, e nunca a saberemos. Certamente terá sido uma resposta de orgástica entrega – ainda que fugaz e inútil. Mas, que importa?


Algoz

1 Comments:

Anonymous Anônimo disse...

Complexo. Bastante complexo.
Eu, enquanto auto-negação ambulante, acredito na necessidade de se negar, sempre. Mas, conheço também a afirmação; e a síntese, que até hoje, parece ser o sofrimento. Enfim.
Cansar-se desse ciclo pode ser uma "boa" consequência, um bom lugar a se chegar. Pode ser.
E que outro jeito há de se arranjar se esse monstro custa a vir?

...

maio 23, 2007 9:27 PM  

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