Confraternização

(Na geladeira)

quarta-feira, abril 25, 2007

O cavalo de Tróia na torre de Babel

– Eterno Amor / de incansável beleza. / Oxigênio do fogo / [intermitente e brando / da comunhão minha / [com o infinito.
– Tá bonito, tá bonito.
– Quer continuar?
– Será?
– Vai, manda ver...
– Volta agora / [quase tarde / na vida / Meu senso de beleza / a me acometer / Com vontades, disparates, / dúvidas das mais cruéis.
– Dolorido, dolorido.
– Vai você?
– Pode ser...
– Então vai.
– Feito Carlos / a quem fosse / dada nova ocasião / De desvendar a máquina / [do mundo, / Meus braços, que com azedume / [trago, / lassos, da Recusa Original, / Sinto agora um querer abri-los, / em displicente consciência / dos eventuais / [forçosos males / [da inesquivável máquina.
– Ai!, como eu padeço.
– Quer mais?
– Não, agora é minha vez.
– Tô ouvindo...
– Penso em campos de tulipas, / frutas frescas, mel / [sabores! / Se ao pôr os olhos na lua / me lembro de pensar / [sonhador, / numa janela, / vêm-me à mente tantas coisas / que não há como explicar
– É...
– Eu sei, podia ter ficado melhor.
– Posso?
– Por favor.
– Abro, então, os braços / como bradasse / [a voz do infinito. / Mas ao som de meus joelhos / indicando minha prostração / ecoa a voz da Crueldade, / bramindo: Não! Não! Não!
– ...acho que não dou conta disso.
– Então vai logo, é sua vez.
– Silêncios, beijos, carinhos / Carícias, cartas, surpresas / Viagens, bombons, bem-casados / Côco, sombra, sossego
– Ai, que delícia!
– Gostou, né?
– É... gostaria...
– Quer continuar?
– Tá pronto?
– Você vai me magoar, né?
– E tem outro jeito?
– Vai logo, então.
– Ajoelhado continuei / [eu que previa o golpe. / Mas meu coração / [confesso, / que no anterior momento / feliz e bobo palpitava, / entrou então em dolorida / [taquicardia.
– Coitado!
– Vai, continua logo... antes... que... eu... chore...
– Mas então, já em nada / [penso / Minhas tulipas todas ceifadas. / E minhas frutas, eternamente frescas / hei de as comer sozinho.
– Puta que pariu! Pára!
– Mas assim é...
– Bom, a minha parte também não tá lá muito feliz, né?
– Imagina...
– Então segura essa...
– Chora cavaco!
– A máquina, em reparo / [eterno, / a outras mãos / [não sei se pensas / seus segredos ofertava / Enquanto eu, avaliando / [constatava / meu próprio, eterno / [desconcerto
– ...!
– ...?!
– Meus sonhos aniquilados. / Pranto, uma vez mais! / Mas há de ter sido a última! / Recolho meu time, / minha boca, meus olhos. / E minha libido / às garrafas entrego!
– ...nosso problema é pensar demais.
– E não?!
– Será que deveríamos declamar isso tudo, aos quatro ventos?
– Aos sete mares?
– Será?
– Acho melhor não.
– E não vamos terminar, cada um, o seu poeminho?
– E não será o mesmo, o meu e o seu?
– Sim, certamente. Mas a sua parte vai pra um lado, a minha vai pra outro.
– De qualquer forma, deixa estar.
– Mas eu queria declamar.
– Não te aconselho.
– E você?!
– Minha fala é meu ato.
– E por que a minha não seria?
– Porque a sua é segredo.
– Ah, é?
– Ah, não?
– Merda!
– Não esquenta...
– Mas como vou me fazer compreender?
– Vou te consolar com um bom e arcaico inglês...
– Manda.
What is understood need not be discussed.
– Hum...
– E viva os Cravos!


Algoz

1 Comments:

Anonymous Anônimo disse...

Acho que esse é um dos textos mais inusitados que passaram por aqui.
Cheio de movimento, pessoas, eventos, sentimentos, tudo muito intenso e muito bonito.

Belo tapa!

abril 30, 2007 11:44 AM  

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