Terça-feira
Era o último ônibus de uma terça-feira qualquer. E tendo eu entrado no coletivo em um dos primeiros pontos, era o único passageiro ainda. Pensava nos afazeres atrasados e nas desfeitas sempre pontuais que de tanto acontecerem hão de ainda um dia me fazer crer ter qualquer coisa aprendido. O motorista, tão homérica ou biblicamente heróico quanto eu, confessava ao cobrador – sentado no primeiro assento – seus grandiosos feitos quotidianos. Tinha uma filha que, sendo desrespeitosa para com os pais, tinha um marido desrespeitoso para consigo mesma. O pai – nosso simpático motorista – a havia alertado no sentido de conhecer melhor a pessoa com quem haveria de dividir as amenidades da vida. Em vão. Certa feita – aparentemente recente –, havia sido obrigado – palavras dele – a castigar a pobre-diaba com uma cintada. E agora se sentia mal com toda aquela delicada situação que se instaurava em seu delicado quase-lar. Mas a cintada havia sido merecida, e nisso ia o mundo a girar – eu pensando no desamor, nas bobagens que todos optamos por fazer, na insignificância de tudo e de todos. E o motorista se transformou – pra mim – num corpo que gesticulava e falava sem emitir som que pelos meus ouvidos entrassem.
Descendo do já segundo ônibus, a quarta-feira dos homens comendo silenciosa e deserta a minha terça – que não acabaria tão cedo –, dois skatistas conversavam ao lado da pista. Um dizia ao outro que a realidade não era apenas o namoro, por isso mais isso mais aquilo, blá blá blá. Continuei meu caminho. Já de longe ouvi duas garaglhadas, uma alta e outra menos. Pensei: – Devem ter chegado à conclusão última de qualquer filosofia: as deliciosas obscenidades da vida.
Chegando em casa fiz um telefonema, jantei um quase café da manhã – a madrugada engolia as pálpebras da terça-feira de meus olhos –, tomei uma coisinha qualquer... e dormi.
Descendo do já segundo ônibus, a quarta-feira dos homens comendo silenciosa e deserta a minha terça – que não acabaria tão cedo –, dois skatistas conversavam ao lado da pista. Um dizia ao outro que a realidade não era apenas o namoro, por isso mais isso mais aquilo, blá blá blá. Continuei meu caminho. Já de longe ouvi duas garaglhadas, uma alta e outra menos. Pensei: – Devem ter chegado à conclusão última de qualquer filosofia: as deliciosas obscenidades da vida.
Chegando em casa fiz um telefonema, jantei um quase café da manhã – a madrugada engolia as pálpebras da terça-feira de meus olhos –, tomei uma coisinha qualquer... e dormi.
Algoz
1 Comments:
O cronista nunca descansa.
Prosa elegante.
Postar um comentário
<< Home