Confraternização

(Na geladeira)

terça-feira, julho 10, 2007

Folhas ao vento

Mas era um céu tão estrelado, mas tão estrelado... e eu lá. Cadeira de praia, garrafa de vinho na mão. Três pessoas, cada uma se ocupando de suas próprias dores e de seus próprios alentos. Estávamos ali! O mar, mesmo empiscinado, cantando sua eterna canção de ninar. E apesar das amenidades e das filosofias cambiadas, eu sentia o silêncio mais profundo de cada um de nós flutuando em direção ao mar de constelações lá longe, longe... e voltando. Indo, e voltando. Três cadentes eu vi. Não fiz pedido: pra ganhar na megasena não adianta; quem foi dessa vida não volta mais; e sorte no amor é a piada pronta de mais mau gosto que já se inventou. Deixei-as cair – caiam, de fato? – sem qualquer consideração que não a beleza mesma de vê-las em movimento. Um movimento que muito rapidamente descreve um arco, pra então atracar num cais que olhos humanos não enxergam. Isso me fez pensar. Assim como o divino, que embrenhado naquele gigante e resplandecente rasto de pirotecnias cósmicas, me olhava e aos meus amigos. Percebi, já no dia seguinte, que apesar de não esperar por qualquer palavra do divino, o divino realmente não me havia dito nada. Nada. Foi engraçado: depois de entrar nessas idéias por essa porta, percebi que apesar de eu mesmo ter tanto pra dizer ao divino, nem por isso tinha eu, tampouco, dito palavra. Ele olhava pra mim, eu olhava pra ele. E pensava nas pouquíssimas pessoas por quem eu daria minha própria vida e que, sabem as estrelas por quê – se é que sabem – não estavam ali, ao meu lado, dividindo comigo o melhor da vida e da morte: um momento eterno. Não porque vá se gravar na memória, mas porque vira uma graça sem data nem hora, da qual apenas se lembra ter vivido, e se lamenta não ter sido partilhada – no silêncio do discurso do amor – com essas pessoas que estavam alhures: com suas alegrias, suas tristezas, e suas companhias que se queria ser. Mas não se é. Então um vento forte dissipou tudo, vindo das águas em direção aos seres vivos em forma de árvore que, atrás de nós, camuflavam nossa não-humilde barraca. Dissipou a triste alegria de estar ali, me fazendo lembrar que estava muito cansado, e que talvez fosse ainda uma hora razoável pra me recolher e descansar: o dia seguinte seria longo e proveitoso, era preciso estar inteiro. Era cedo ainda: nem dez horas.
Acordamos cedinho. E às oito da manhã já estávamos mais ou menos no mesmo lugar da noite anterior, ouvindo o mesmo mar e olhando o mesmo céu, transfigurado numa imagem na qual não se reconhecia o que dez horas antes tinha sido. Pensei então nas pessoas, que apesar de estarem socialmente presas ao conceito de coerência, mudam e demudam – mais demudam do que mudam – como quem era lua e virou sol: continuam lá, mas se ocultam de nós.
A estrada tinha muitas curvas. E se é perigosa de qualquer jeito, me eximo de fazer juízo. Mas há de haver quem se apague de todas as luzes, na noite mais escura e escusa, e nem a própria estrada saiba onde e como está. E há de haver quem se apague e não mais se acenda. E as árvores, umas aqui, outras ali, haverão de sempre sentir um vento que, como sopro apenas, as faça saberem que aquela luz viajante apenas se apagou, mas continua... E a lua, aleatoriamente, iluminará ainda que apenas o suficiente o vibrar das folhas das árvores, descendo por suas entranhas até se perder...
Continua.



Algoz

3 Comments:

Anonymous Anônimo disse...

Senhor!
Tão bonito quanto aquele mar, aquelas estrelas, aquele momento...
Obrigado por dizer como foi, e desse jeito lindíssimo.

(A gente sente tanta coisa, né? É meio triste, mas é feliz, e tão bonito...)

...
...
...

julho 11, 2007 11:26 AM  
Anonymous Anônimo disse...

Deep, deep, deep. Love it. Love u.

julho 11, 2007 11:49 AM  
Anonymous Anônimo disse...

Que lindo, Le !
melhor descrição não deve haver mesmo !!!!!
beijocas
Pri

julho 12, 2007 8:27 PM  

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